segunda-feira, 21 de março de 2011

STF decide se livro eletrônico é igual a livro de papel

Felipe Recondo - O Estado de S.Paulo
A evolução da tecnologia levará o Supremo Tribunal Federal (STF) a rediscutir o conceito de papel, usado para a publicação de livros, jornais e periódicos. Por consequência, poderá estender a imunidade tributária prevista na Constituição para os livros aos aparelhos de leitura, como o Kindle, e às publicações em CD.
Em um processo que trata do tema, os ministros do tribunal reconheceram que o assunto tem repercussão geral. É um indicativo da importância do tema e um sinal de que o tribunal pode alterar seu entendimento sobre o assunto. No processo específico, o STF julgará se são imunes as peças eletrônicas vendidas junto com material didático destinado ao curso prático de montagem de computadores.
Mas, no seu voto, o relator do processo, ministro Marco Aurélio Mello, adiantou que será necessário definir a abrangência exata do trecho da Constituição que garante a imunidade tributária de livros, jornais e revistas. "Na era da informática, salta aos olhos a repercussão geral do tema controvertido", afirmou. "Passo a passo, o Supremo há de estabelecer, com a segurança jurídica desejável, o alcance do texto constitucional", acrescentou.
A jurisprudência atual do STF é restritiva. Garante apenas aos livros de papel a imunidade tributária prevista na Constituição. No ano passado, por exemplo, o ministro Dias Toffoli decidiu não ser imune a tributos uma enciclopédia jurídica eletrônica.
Afirmou que o previsto na Constituição não se estende para "outros insumos" que não sejam o papel destinado à impressão dos livros ou periódicos.
No entanto, advogados tributaristas consideram a discussão pelo STF inevitável. E as razões citadas são diversas. A primeira delas é a demanda cada vez maior por aparelhos para leitura de livros eletrônicos. "É preciso reformular o conceito de papel. Há cada vez mais gente tendo acesso a esse tipo de tecnologia. E essa tecnologia está substituindo o papel", afirmou o advogado Dalton Miranda, do escritório Dias de Souza.
Impacto ambiental. Outra razão é a preocupação com o meio ambiente. O STF, por exemplo, está extinguindo os processos em papel. Para alguns tipos de ação, o Supremo só aceita petições eletrônicas. Além disso, a preocupação do governo com a ampliação do acesso à internet passa pelo acesso facilitado a novas tecnologias. "Esse assunto tem de ser tratado de forma inclusiva. Essas tecnologias não podem ser vistas como símbolo de status e de riqueza", argumentou Marcel Leonardi, advogado na área de internet e tecnologia e o primeiro a obter decisão favorável à imunidade dos aparelhos de leitura de livros eletrônicos.
Em 2009, Leonardi conseguiu na Justiça uma liminar para importar o Kindle sem o recolhimento de impostos. A liminar foi depois confirmada no mérito pelo juiz federal José Henrique Prescendo. Na decisão, ele afirmou que a Constituição, ao garantir a imunidade para livros, revistas e periódicos, quis "promover o acesso dos cidadãos aos vários meios de divulgação da informação, da cultura e viabilizar o exercício da liberdade de expressão do pensamento, reduzindo os respectivos custos". E isso, no entendimento do magistrado, deveria valer para todas as tecnologias. "Nota-se, por uma singela interpretação literal do texto constitucional, que os livros, jornais e os periódicos são imunes de tributos, independentemente do respectivo suporte (...). Seja em papel, seja em plástico, seja em pele de carneiro, etc".
A Receita recorreu da decisão. O processo aguarda julgamento pelo Tribunal Regional Federal da 3.ª Região. Se a decisão for mantida pelo TRF, Leonardi espera que a Receita leve a discussão para o Superior Tribunal de Justiça (STJ). No STF, o julgamento do processo também não tem data marcada.

PARA LEMBRAR

O Kindle, leitor de livros eletrônicos desenvolvido pela livraria virtual Amazon, foi lançado em novembro de 2007. Desde então, foram lançadas mais duas versões do modelo original, com tela de seis polegadas. A Amazon também colocou no mercado o Kindle DX, com tela maior, de 9,7 polegadas.
Desde 2009 está disponível uma versão internacional, que permite ao consumidor comprar livros pela rede celular de terceira geração em mais de 100 países, sem ter de pagar pelo tráfego da operadora.
Quando foi lançado, o Kindle custava US$ 399 nos Estados Unidos, e hoje é vendido por US$ 139. Segundo a Amazon, trata-se do produto mais vendido da história do varejista virtual.
Em 2010, o digital foi o formato que liderou as vendas de livros na Amazon. 


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